Acerca do InnovPlantProtect e deste assunto tão complexo, mas também tão aliciante, ninguém melhor que o Professor Pedro Fevereiro, para nos falar de uma forma muito clara, do mundo dos pesticidas, das doenças e pragas na agricultura.
Atendendo à extensão do tema, sua complexidade e delicadeza, foi opção da redação a sua divisão por duas peças. Assim, a primeira parte da entrevista, que agora publicamos, versará sobre o estudo de doenças e pragas na agricultura mediterrânica. A segunda parte da entrevista irá debruçar-se sobre o laboratório colaborativo e suas parcerias .
Pedro Fevereiro, CEO do InnovPlantProtect, garante que um dos objetivos do laboratório colaborativo é contribuir para uma produção agrícola nacional mais competitiva e com impactos económicos, ambientais e sociais positivos.
O InnovPlantProtect é um laboratório colaborativo (CoLab) concebido para desenvolver estratégias que reduzam o impacto de pragas e doenças, sobretudo emergentes, na agricultura mediterrânica.
De acordo com este professor, um dos grandes desafios da agricultura é o controlo de pragas e doenças, às quais se deve a perda de entre 40% a 60% da produção agrícola global.
Contudo, não será possível acabar com elas, porque as pragas e doenças existirão sempre.
Pedro Fevereiro explica que “O que vamos fazer é criar soluções inovadoras de base biológica para promover culturas agrícolas mais sustentáveis, ou seja, mais seguras (não tóxicas para seres humanos e animais). Mas mais eficientes (mais produtivas) e com menos impactos no ambiente”.
As culturas que vão ser abordadas neste projeto, são essencialmente as permanentes e anuais estabelecidas em Portugal e noutros países com clima mediterrânico. São exemplo a vinha, olival, milho, trigo, tomate e, eventualmente, pera e maçã.
Questionado sobre que tipo de pragas em que o estudo vai incidir, Pedro Fevereiro sem quer ser exaustivo, enumerou algumas pragas e doenças com características distintas:
– o percevejo marmoreado ou percevejo asiático. Uma praga instalada nos EUA e que na Europa, por exemplo em Itália, está a ser preocupante. Já causou importantes estragos nas culturas -muitas pessoas consideram-na a praga do século XXI;
– a Xyllela fastidiosa, uma bactéria que se instala nos vasos condutores das plantas lenhosas, atacando sobretudo o lenho das árvores de fruto;
– a Drosófila suzukii, que afeta vários frutos; a diabrótica, uma lagarta que ataca as raízes do milho;
– a traça da Guatemala, cujas larvas constroem galerias nos tubérculos da batata; a ferrugem amarela, que ataca o trigo e outros cereais.
“Todas estas pragas e doenças são motivo de grande preocupação. Não existe atualmente nenhuma planta resistente e nenhum pesticida que as consiga controlar eficientemente” salientou o CEO do InnovPlantProtect.
Relativamente a soluções para a redução destas pragas, Pedro Fevereiro, explica que as que existem e que podiam eventualmente ser utilizadas estão a ser descontinuadas.
Devido aos seus níveis de toxicidade ou ao seu espectro de atuação muito amplo, que podem afetar insetos e outros organismos benéficos para o meio ambiente ou até mesmo pessoas, a legislação está a retirar do mercado as formulações que poderiam controlar alguns desses fatores bióticos que afetam as culturas.
Por outro lado, há novas pragas e doenças para as quais não existem atualmente nenhuma planta resistente e nenhum pesticida que as consiga controlar.
O InnovPlantProtect, tem três anos para conseguir pelo menos duas soluções capazes de funcionar em condições reais. Na primeira fase estão a ser selecionadas as pragas e doenças a abordar.
Embora os cientistas deste CoLab, já tenham uma noção de como controlar essas pragas e doenças, a mesma não foi revelada. Apenas, que passa por metodologias inovadoras, utilizando sobretudo moléculas biológicas.
Sendo o InnovPlantProtect, um laboratório corporativo, a decisão para identificar um conjunto de prioridades, passou por uma discussão com os associados do laboratório.
Identificadas cerca de 10 prioridades, e porque eram demasiadas, estão agora a ser avaliadas duas ou três, de acordo com os seguintes critérios:
– Incidência – Aferir se a doença/praga tem uma amplitude suficientemente abrangente não só em Portugal como em vários locais do mundo de clima mediterrâneo, por exemplo Califórnia (nos EUA), África do Sul e Austrália.
– Disponibilidade de condições no campo para fazer experimentação com essa doença/praga.
– Ineficiência ou a descontinuação das soluções existentes no mercado.
“É a conjugação destes critérios e de outros critérios que nos permitirá decidir se temos capacidade técnico-científica para desenvolver a solução” explica Pedro Fevereiro.
O InnovPlantProtectpretende desenvolver novas soluções de base biológica (aquilo a que genericamente se designa biopesticidas) e utilizar a tecnologia da edição do genoma (como o CRISPR-Cas9) para desenvolver variedades de plantas resistentes ao ataque de doenças.
A edição do genoma é uma tecnologia que permite alterar as características das plantas de forma a torná-las resistentes, podendo acontecer que sejam necessárias ambas as soluções [base biológica e tecnologia de edição] face a uma praga muito agressiva.
Por vezes por muito que se trabalhe com a planta, pode não ser possível criar uma variedade 100% resistente, no entanto, é possível conseguir um controlo efetivo da praga se a planta, ainda que parcialmente resistente, for apoiada pela aplicação de um determinado produto com caraterísticas biológicas.
Mas soluções biológicas são soluções não-químicas? A resposta do entrevistado foi que a generalidade das pessoas pensa que químicos são os produtos de síntese. Isso não é verdade “Tudo o que é vida é químico. No caso dos produtos que vamos tentar desenvolver, serão soluções químico-biológicas na medida em que terão por base, sobretudo, ácidos nucleicos (pequenos RNA de interferência) e pequenas proteínas que têm a capacidade de inibir a interação entre os organismos patogénicos e as plantas que queremos defender”.
“É com este tipo de moléculas que vamos trabalhar. Como disse no início da entrevista, não são tóxicas para seres humanos e animais. São específicas e com menos impacto no ambiente do que os agroquímicos de síntese atualmente existentes” refere Pedro Fevereiro.