A rota mágica da Beira Baixa …
5 Km… É esta a distância indicada numa placa da estrada nacional a caminho da aldeia de Idanha-a-Velha. Em cada curva e reta nesta estrada de horizonte deixamo-nos conduzir pelas terras da Beira Baixa, terra de tradições intermináveis, de aldeias imersas em riquezas históricas cuja enciclopédia não conseguia abarcar. Não acreditam? Os nossos convidados desta aventura também não acreditavam…
Avé Idanha-a-Velha…
Ydania, como era assim designada no início da nacionalidade, foi um importantíssimo polo de mercantilização, militar e religioso ao longo de diferentes civilizações. Idanha-a-Velha foi a Igaedum com os romanos, a Egitania com os visigodos e a Exitania / Antaniya com os muçulmanos. É uma aldeia que transpira história em cada pedra, em cada rua e em cada edifício. Percorremos as suas muralhas, tais soldados que as patrulhavam sempre com os sentidos em alerta e de olhar fixado no horizonte. Mas o culminar da nossa visita atingiu-se nos locais, cuja visita se torna imperiosa, como é o caso da Sé Catedral, no Lagar de Varas e no Arquivo Epigráfico, este último um santuário do legado da ocupação romana. Foi como o tempo retornasse e, num ápice, tivéssemos laivos cinematográficos de Gladiador ou Ben-Hur.
A beira Baixa reserva-nos supresas nesta rota mágica…
Continuamos a caminhar por esta aldeia sulcada de histórias até que uma surpresa nos emerge. Avisamos que as surpresas nestas aldeias são muito frequentes. Essa é umas das suas inúmeras virtudes. Uma senhora de idade, empunhando o seu adufe, instrumento de precursão, cuja origem se perde nos antípodas do tempo, decide-nos brindar com uma pequena atuação. Aqui, tal como no Fado, faz-se silêncio, ouve-se, aprecia-se e aplaude-se de pé…
Rumo ao Monte Santo nesta rota mágica da Beira Baixa…
Passamos pelo forno comunitário, onde nos brindam com um pão caseiro confecionado à mão e cozido em forno de lenha. É daqueles prazeres já remotos. Só o aroma que paira no ar carrega-nos as baterias para continuarmos a nossa caminhada por terras da Beira Baixa. E de Idanha-a-Velha saímos com aquela sensação de que, neste lugar, a história é mais valiosa que um diamante em bruto.
Caminhamos por antigos trilhos, cujas pedras e calçadas já estão gastas pelos séculos de passagem de pessoas e animais. Por aqui circulavam mercadores, cavaleiros, gentes locais e também pastores e rebanhos transumantes, durante as suas migrações sazonais. Em redor, os campos explodem de cor, já que a floração da Primavera está no seu auge, levando-nos a considerar que o arco-íris decidiu mudar-se do céu e a instalar-se na terra. Circundados por monumentais sobreiros e blocos de granito in situ, de colossal dimensão, um templo surge-nos numa área ampla. É aqui o nosso local ideal para a merenda do caminheiro. Sentados na orla da Capela de São-Pedro-Vir a Corça, um importante templo cristão do séc. XII / XIII, imaginamos a pitoresca feira medieval que aqui se ordenou, quando o rei D. Dinis outorgou Carta de Feira em 1308. Podíamos ficar aqui a imaginar os saltimbancos a fazerem travessuras, os nobres nos seus cavalos, o povo dançando e entretendo-se nos jogos populares, os mercadores a vender de tudo. Infelizmente o tempo não se controla e este é imparável.
Do granito nascem as nossas casas…
Mas imparáveis fomos nós e continuamos por uma calçada ingreme e austera. Mas é o prelúdio que algo totalmente inacreditável e diferente está a chegar. Diz-se, na gíria popular, que o melhor é o mais difícil de alcançar. Será verdade esta sina?
Respiração suspensa, não pelo cansaço mas quando entramos em Monsanto e temos que assimilar muito bem aquilo que vemos e estamos a viver. Tudo nesta vila é diferente, mesmo tudo. Como introdução, temos esta menção do etnógrafo Cardoso da Marta que, em 1938, a proferiu no concurso A aldeia mais portuguesa de Portugal.
“Nunca se sabe em Monsanto
(que as águias roçam com as asas)
se a casa nasce da rocha
se a rocha nasce da casa”
E isso verifica-se na sua plenitude. Aqui as rochas de granito são parte de cada casa, como se de vizinhos ou animais de estimação se tratassem. “Fazem parte da família” como nos foi referido por um cidadão local. É humanamente impossível expressar neste artigo as sensações que se vivem nesta povoação. Só vindo, só percorrendo-a, só contactando com as gentes locais, podemos ficar minimamente a par do que é Monsanto.
Com esta vista conquista-se o mundo…
Subir, é a palavra de ordem. Em direção ao castelo, tal exército conquistador por entre este mundo á parte, conhecemos a Casa de uma Só Telha, os miradouros de luxo que Monsanto possui, as ruínas de São Miguel, antiga freguesia de Monsanto. Finalmente entramos no castelo, com os seus vestígios e pormenores arquitetónicos de diferentes épocas, reveladores da riqueza histórica aqui expressa. A igreja de Santa Maria do Castelo brinda-nos e dá-nos o sinal que as vistas 360º destas muralhas são uma relíquia. Chegámos a uma conclusão óbvia. Deste local conquista-se o mundo só com o olhar…
A descida iniciou-se por um labirinto de blocos graníticos até entrarmos novamente no burgo. À porta de uma casa singela, mesmo ao lado da casa do médico e escritor, Fernando Namora, deitamos um ‘olhar maroto’ às Marafonas, que estão expostas no parapeito. Bonecas de pano, com trajes coloridos mas sem olhos, sem boca e sem orelhas. Era geralmente oferecida no dia de casamento e seria colocada debaixo da cama como ‘elixir’ de fertilidade e felicidade do casal. Acreditamos piamente que sim!…
Sentimos que a nossa jornada de descoberta está próxima do seu terminus. Tanto ainda para ver, ouvir e sentir. É nestes momentos que se dá a razão e a mão à palmatória. Não existe enciclopédia que consiga traduzir e expressar tudo isto. Só vendo, só vindo até nós…
NOTA IMPORTANTE: Em alguns dos locais mencionados desta rota mágica da Beira baixa aconselha-se a visita com acompanhamento de guia
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