Covilhã: do passado dos teares à arte do futuro
Recuamos a 2011 quando a palavra ‘Woolfest’ era uma mera novidade. Uma novidade que decidiu quebrar as regras e trazer esta cidade para o centro do que era a arte urbana. Três pessoas, três vontades, três filosofias que decidiram de forma conjunta e assertiva mudar a face desta cidade, quem nela habita e decida visitar.
Pedro, Lara e Elisabet
Três nomes que se aliaram e decidiram dar “o pontapé de partida” e só com a sua vontade e determinação iniciaram a transformação de uma cidade. Se era intencional, não sei, nunca os questionei sobre isso, mas sei que a cidade virou uma página da sua história. Hoje, em qualquer publicação sobre a “cidade-neve”, aparece uma fotografia de um mural, uma selfie, um post ou uma referência jornalística a esta iniciativa. Digamos, que o Wool – Covilhã Arte Urbana é a evolução natural da cidade, a adaptação da cidade ao novo ‘habitat’ civilizacional. É a transformação da genética da Covilhã e que lentamente já está a fazer parte do seu ADN como urbe.
Um roteiro, infinitas interpretações
Não vou contar as vivências dos incontáveis roteiros pedestres guiados que fiz ao longo destas ruas, ruelas, largos do centro histórico, porque cada interpretação de um mural é diferente aos olhos de cada indivíduo. Há imensas referências, formas diferentes de contar, de relatar as experiências… Como uma expressão de arte, também as suas interpretações são as mais diversas. A arte representada, a título de exemplo, numa tela e, neste caso, numa parede, na minha visão como cidadão é isso mesmo: uma expressão de algo singular, próprio, individual do artista que faz suscitar milhares de opiniões ao coletivo.
Desta vez vou alterar a forma como escrevo e tentar perceber como estes murais transformaram esta cidade e como olhamos para ela, tal como o fizeram o Pedro, a Lara, a Elisabet, como os pilares da ideia, da arquitetura do projeto, e os artistas e as diferentes pessoas que gravitaram e ajudaram na tradução da ideia, do pensado, para o elemento real visual e hoje presente a todos. Cada obra e/ou cada mural, tendo uma ligação ao território em si, trouxeram à tona um pouco de nós, covilhanenses, dos nossos concelhios e obviamente da nossa cidade: memórias, personalidades, histórias, lendas, enfim, um conjunto vasto de temáticas. Mas fizeram-no num conceito diferente, em oposição ao tradicional, dando relevo a uma nova manifestação de vontades que se expandiu nas nossas cidades. Há quem deteste, há quem aprecie e há quem o ‘nim’ é a resposta mais simples, mas que é igualmente valiosa. É este ‘triângulo amoroso’ de opiniões que já fez este projeto ser um dos elementos identitários mais importantes da Covilhã de hoje.
O mexer das consciências
Quando existe a colisão do tal triângulo amorosos é porque cada mural aprisionou a nossa atenção e curiosidade. ‘Curiosidade’… Algo tão humano que até descoramos que foi um bem que nos permitiu os vários saltos evolutivos como espécie. O porquê daqueles traços, daquelas técnicas utilizadas pelos artistas, os jogos de cores e materiais utilizados, o que significa o olhar, o gesto de quem é representado? Qual o significado que eu, tu e outros dão? Tudo isto porque estamos a pensar, a processar a informação visual e tentar dar-lhe um significado. E pensar é algo que faz mesmo muita falta e esta forma de arte é exímia em manter essa faculdade bem oleada e evitar que entre em extinção. Por isso, considero que o Wool – Covilhã Arte Urbana, mais que projeto artístico, é o ponto de ignição de uma nova perspetiva social, não só da cidade, mas também das pessoas, quer sejam locais ou visitantes. É trazer mais apego pelo nosso centro histórico e fazer as pessoas pensar que a cidade, as suas gentes, a sua história são um ser holístico, ou seja, é um todo e, como tal, tem de ser visto dessa forma.
Futuro…
Tivemos a cidade dos teares, da manufatura, das fábricas imponentes e, da mesma forma que estes são um símbolo da história da nossa cidade e concelho, vemos agora a arte urbana expressa nas ruas e no seio da comunidade, como mais uma ‘ferramenta’, a par com outra vertentes como o vitalizante empreendedorismo da Universidade da Beira Interior e o saber fazer das nossas gentes, para pautar e a projetar a imagem de uma outra cidade para o futuro. Mexeu com ela e com as pessoas. Eu digo ao Pedro, à Lara e à Elisabet que é preciso continuar. É a evolução das coisas e como tudo o que é novo, faz parte do processo natural da rutura necessária.
NOTA IMPORTANTE: Embora o percurso que efetuamos tenha sido na cidade da Covilhã, aconselha-se a visita com acompanhamento de guia. Há detalhes que se nos escapam e que fazem a diferença.
Artigos relacionados (17) com Covilhã: do passado dos teares à arte do futuro:
Interior do país – Chegou o Tempo