Joaquim Arnaud, produtor, agricultor e especialista em vinhos e em iguarias tradicionais é descendente de uma família alentejana, de Pavia, ligada à lavoura, e aí documentada desde 1515. Aos 18 anos deixou os estudos, tornou-se um autodidata e desenvolveu vários produtos na sua enorme propriedade, entre os quais o único presunto de vaca que existe em Portugal. Faz vinho a que dá o seu cunho pessoal “Faço o vinho à minha maneira como eu acredito que deve ser feito, seja no Alentejo ou noutro sitio qualquer” , diz Joaquim Arnaud.
Foi no passado dia 1 de dezembro, que o produtor de vinhos Joaquim Arnaud abriu as portas da sua casa, em Pavia, no Alentejo, para reunir vários amigos ligados ao mesmo ofício. A festa contou ainda com três restaurantes uma loja de produtos locais, bem como masterclass de vinhos e de azeites
Depois do sucesso registado na estreia em 2022, o evento Joaquim Arnaud & Friends regressou a Pavia para encher a adega das talhas desta casa secular, do concelho de Mora, com pequenos produtores de vinhos. Foram mais de 15 e deram a provar referências de regiões vitivinícolas de norte a sul do país.
Mas Joaquim Arnaud é muito mais que um produtor de vinho. Em 2022, surpreendeu ao criar um evento enogastronómico, a que deu o nome de Joaquim Arnaud & Friends. Um momento de portas abertas ao público, que juntou outros produtores, amigos convidados pelo próprio Joaquim, para um evento que já se tornou uma referência, pela irreverência e diferença no formato, e pela originalidade da localização.
Foi no evento deste ano, que conhecemos Joaquim Arnaud. Um homem simples, afável, com quem é fácil conversar. Contou-nos alguma da sua história, porque como se costuma dizer “a sua vida dava um livro”, e que livro!
“Desde 1640 que a minha família está em Pavia e desde 1883 as propriedades situadas nos concelhos de Mora e de Arraiolos, no distrito de Évora permanecem, até hoje, nas mãos da família e perfazem o total de 850 hectares. “Sempre fomos agricultores”, conta-nos Joaquim Arnaud.
Prova disso é o facto de, em 1991, com 18 anos ter decidido trocar os livros pela agricultura. Outra curiosidade é o facto de o nome Joaquim Arnaud existir desde 1882 na família, alternando o segundo nome entre ‘Antonio’ e ‘Pedro’, como refere Joaquim António Arnaud.
Joaquim um fervoroso convicto dos benefícios da agricultura biológica, porque “a terra não nos pertence, pertence aos nossos filhos”, explica-nos que o conhecimento acerca das vinhas e do vinho foi adquirido através dos livros deixados pelos seus antepassados que, desde 1880, registavam tudo acerca das sementeiras, entre outros assuntos inerente à lavoura. “Comecei a ler tudo o que se fazia e fiz tal e qual! Aprendi muito por mim próprio. Sou um autodidata.”
“Decidi investir e recuperar a quinta da família, onde tenho um pequeno (grande, dizemos nós) museu. Além da agricultura e da criação de vacas, plantei vinha de sequeiro em 2001 e comecei a produzir o meu próprio vinho.”
No Joaquim Arnaud & Friends, foram apresentados dois vinhos: Arundel e Terras de Pavia, ambos de Joaquim Arnaud. No rótulo na parte de trás, a homenagem ao antepassado Guilherme Arnao, descendente dos Condes de Arundel, vindo de Inglaterra para Portugal acompanhando a princesa D. Filipa de Lencastre, que por cá ficou como seu vedor e mordomo-mor, acabando por morrer na batalha de Alfarrobeira onde combateu ao lado de D. Pedro.
As experiências vínicas não ficam por aqui. Joaquim Arnaud fala-nos acerca do próximo espumante. Este está incluído nos “lotes feitos em casa alheia”. Sairá de uma adega de Monção feito a partir de Alvarinho e Trajadura, duas castas autóctones da Região Demarcada dos Vinhos Verdes. “Vai ser um Espumante Super Reserva Bruto Natur de 2015, uma edição especial de 1900 garrafas numeradas. E porquê Monção perguntámos? “Porque a adega fica a 500 metros da ponte onde foi celebrado o contrato de casamento entre D. João I e D. Filipa de Lencastre.”
É esta vasta herança que motiva Joaquim Arnaud a trabalhar e qual “Professor Pardal” a inovar cada vez mais. É nos produtos que levam o seu nome que apresenta o melhor. Como no azeite, por exemplo, que começou a fazer há três anos, e do qual só produz 2000 garrafas, com azeitonas das suas oliveiras, parte das quais antigas, com mais de 500 anos.
Do vinho que não gosta, faz vinagre “Espero conseguir lançar no final deste ano, um vinagre de 2003. Nesse ano não gostei do vinho e foi todo para vinagre. Quando não gosto dos meus vinhos, maioritariamente vão para vinagre. Já temos mais de quatro mil litros em casa. Aqui nada se perde e tudo se transforma.”
Também foi Joaquim que fez o primeiro presunto de vaca em Portugal, a famosa Cecina espanhola “Surgiu a ideia de fazer uma cecina de vaca. Em Portugal não se trabalha muito a conservação de carnes como se fazia há 200, 300 anos, que é uma cura com sal. Na zona de Leão, onde mando fazer a cura, ainda se faz a cura à moda ancestral”
No meio desta azáfama, está a recuperar a casa de Pavia. Nas antigas cavalariças há um museu de alfaias agrícolas. Na casa senhorial, uma biblioteca com mais de cinco mil livros, uma outra de livros de cozinha com mais de 700 exemplares e o arquivo da casa agrícola com documentos desde 1700 até hoje, que “quando tenho insónias venho catalogar os papéis”, refere acrescentando, ”ainda no outro dia entre muita coisa espalhada e diversa encontrei um documento fabuloso: uma muito antiga apólice de seguro da Lloyds em Londres com 45 nomes que era um seguro de acidentes de trabalho. Sempre houve preocupação social na nossa casa.”
A nossa agradável conversa, teve de terminar. Alguém solicitava a presença do nosso anfitrião. Quem sabe um dia possamos contar mais um pouco da história de vida de Joaquim Arnaud, casado com Luisa, uma das proprietárias da Quinta dos Plátanos “Fui à quinta trabalhar os vinhos e conheci-a. Olhei e pensei – Vai ser minha mulher e foi”, pediu-a em casamento e “ pus-lhe uma condição: Quando tivéssemos um filho teria de ser Joaquim! e ela aceitou”. Hoje o Joaquim tem quatro anos e já começa a entrar no mundo dos vinhos pela mão do pai, Joaquim Arnaud.