Maio… Mês em que a cereja ‘donzela da Cova da Beira’ diz: – sim, estou presente. A cereja domina o território e pinta a paisagem beirã com aquele vermelho sangue que eleva o nível deste fruto aos píncaros da sedução das papilas gustativas. De facto, ignorá-la é um crime. Grave, gravíssimo!…
Fruto que hipnotiza
Sendo impossível fugir ao seu chamamento atrativo, rumamos a uma quinta privada, onde a simpatia dos seus proprietários está ao mesmíssimo nível das fantásticas cerejas que produzem com um carinho quase materno. Quilómetro após quilómetro, um oceano de cerejeiras surge a perder de vista na paisagem. Dispostas em socalcos, impávidas e serenas, mostram nos seus ramos o seu maior tesouro. A ansiedade dos nossos convidados sobe quase de imediato, ficando petrificados, sem pronunciarem uma palavra e ignorando qualquer atenção à minha pessoa. Uma das muitas propriedades atribuídas a este fruto comprova-se: hipnotizador.
A verdade revela-se
Recebidos que nem reis pelas gentes beirãs, somos levados às nossas anfitriãs que tanto desejamos conhecer. Abrem-nos as portas deste mundo mágico e entramos numa espécie de ‘passerelle’. Mas aqui quem desfila não somos propriamente nós. Quem é o foco de atenções e dos holofotes são estes seres arbóreos de aparência terna e até frágil, mas que têm no seu berço o que já chamaram “o amor em forma de fruto”. De cesta de verga na mão, somos convidados a interagir com este fruto gracioso.
Clímax
De forma delicada e silenciosa tocamos e retiramos o fruto vermelho do seu cordão umbilical fazendo aquele movimento tão primitivo para posteriormente levá-lo à boca. Nada do que se possa escrever pode aproximar-se de uma definição óbvia e concreta sobre a textura, o sabor e a doçura de uma cereja da Cova da Beira. Creio que ainda não existe uma definição humanamente possível para este clímax. Teixeira Pascoaes define mesmo este fruto como “vida infinita”, elevando-o quase a um símbolo de eternidade.
De volta à Terra
Como tudo na vida, a apoteose do momento esgota-se e regressamos à realidade das coisas. O tempo nunca pára e temos que regressar. Os nossos anfitriões não se despedem, sem antes, nos mimarem com as iguarias derivadas da cereja, deixando-nos, ainda, mais adictos.
Eles sabem, no seu íntimo, que o vício vai fazer-nos voltar.
Nota importante: Neste tipo de percurso aconselha-se a visita com acompanhamento de guia.
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