Uma década depois de terem apresentado o álbum de estreia no Rock in Rio, os The Black Mamba subiram ao palco Galp Music Valley para um espetáculo familiar. No backstage, Pedro Tatanka e Miguel Casais não quiseram para já falar dos próximos dez anos.
O estilo musical dos The Black Mamba tornou-se inconfundível no repertório contemporâneo português: um funk cálido e convidativo que se alia a uma soul vintage e nostálgica dos tempos de James Brown e de Curtis Mayfield. Tudo isto perfeitamente embrulhado na voz de Pedro Tatanka. Ao contar dez anos desde o lançamento do álbum de estreia, a banda volta a pisar os palcos do Rock in Rio com novas caras na plateia, novos êxitos no arsenal, mas sem deixar para trás o prazer e a memória de fazer música enquanto amigos. Neste reencontro, houve espaço para largos elogios ao público, risos entretecedores e, claro, para a solene “Love Is On My Side”. O aNOTÍCIA.pt encontrou-se com os The Black Mamba momentos antes de pisarem o palco do Rock in Rio 2022.
Apesar de serem já uma banda com reconhecimento cá em Portugal, houve um momento que efetivamente mudou a maneira como as pessoas viam os Black Mamba, a Eurovisão. O que me faz perguntar: existe uma diferença pré-Eurovisão e pós-Eurovisão para os Black Mamba?
PT: Existe uma diferença enorme. Felizmente, nestes últimos 12 anos angariámos uma base de fãs muito fiel – fizemos quatro Coliseus antes da Eurovisão, já atuámos em palcos principais de tantos festivais e já estivemos aqui há dez anos – mas o mainstream foi só alcançado no momento em que ganhámos o festival da canção e depois a participação na Eurovisão. Portanto, há uma banda pré-Eurovisão e há os The Black Mamba pós-Eurovisão. Mas isso tem a ver com o reconhecimento do público, para todos é tudo igual: continuamos fiéis e nós próprios e felizes por estarmos a fazer música juntos.
Foi a primeira vez que Portugal cantou inteiramente em inglês e foi uma lufada de ar fresco…
PT: Aonde é que foi? [risos]
Tendo em conta a tradição de cantar na nossa língua materna, o que vos levou a tomar esta decisão?
PT: Foi uma decisão arriscada. Eu fui convidado para fazer uma música. Eu tinha uma música para os The Black Mamba, mas pensei que poderia ser uma ótima oportunidade para internacionalizarmos a banda da forma como sempre quisemos. Foi uma hipótese muito remota, quer dizer alguém ganhar a cantar em inglês após mais de cinquenta anos é sempre arriscado…mas, caraças, aconteceu. Hoje estamos com tournées na Europa, que nunca tivemos, e não podemos deixar de estar felizes com tudo isto. Às vezes os astros alinham-se de uma forma da qual não estamos à espera e, como se costuma dizer, quem não arrisca não petisca.
Agora fora do universo Eurovisivo, o último trabalho de estúdio dos The Black Mamba é de 2018, mas vários singles têm surgido desde então – “Sweet Amsterdam”, “Love is Dope”. Haverá um álbum brevemente?
PT: Sim, sem dúvida.
MC: Sim, estes são singles de um álbum que está para vir, um álbum conceptual. Estamos a apontar para a reta final deste ano, início do ano que vem e vai ser uma masterpiece, sem querer esticar-me muito [risos].
PT: Mas vai ser uma masterpiece, sem dúvida!
Estes dois temas em particular têm uma sonoridade um pouco diferente, sem esquecer a essência da banda: são mais ritmados, vintage, mais soul e funk. Oiço muito Prince (especialmente no Love is Dope): há aqui uma influência direta?
PT: É uma direção nova…mas que ao mesmo tempo sempre existiu. Penso que ela estava dissipada, diluída em vários estilos de música que íamos abordando em outros discos que fizemos no passado, que acabavam por ser um pouco esquizofrénicos no ponto de vista estético e acabavam por englobar mais estilos de música diferentes no mesmo disco. Este disco vai ser mais coerente porque vai ser essa alvada. Em relação ao Prince, há uma influência, mas penso que também há influência daqueles nomes onde o próprio Prince foi beber. Gil Scott-Heron, Isaac Hayes, James Brown, sei lá…todas essa eras. Se ouvires o Musicology do Prince, ou os Earth, Wind & Fire, há uma homenagem a todos esses nomes e é um pouco isso também que queremos fazer com este trabalho. Estes estilos vão ser, e estão, a ser replicados ao longo dos anos por artistas que gostam dessa música. Nós não somos exceção, apesar de nunca termos condensado essas num só disco.
Tem havido um revivalismo destes sons mais retro, quer cá dentro como lá fora. Foi um aspeto ao qual queriam fazer parte enquanto faziam este disco?
MC: Acabou por ser uma coincidência. É claro que já nos apontaram algumas semelhantes com um ou outro artista, especialmente com Silk Sonic e tal…
PT: Eles próprios estão a fazer um tributo aos sons essa altura.
Não há então um novo reconhecimento pós-Eurovisão; ou seja, uma forma de ir ao encontro destes novos fãs?
PT: Queres que te seja muito sincero? Na minha opinião, o que estamos a fazer é muito arriscado, pois aquilo que se esperaria de uma banda que tivesse uma label seria outro sucesso igual ao “Love Is On My Side” – era o que qualquer banda faria na nossa situação e eu sinto que estamos a fazer o total oposto a isso. Estamos a aproveitar este momento em que temos imensas pessoas a olhar para nós para mostrar-lhes quem realmente somos e do que somos capazes.
E é nessa essência que a banda perdura. O vosso primeiro disco saiu precisamente há dez anos e ao longo desse tempo, qual é a principal diferença entre os The Black Mamba de 2012 e os The Black Mamba de 2022?
MC: Para já a banda teve mudança de elementos por forças de circunstâncias. Houve elementos que saíram, outros que entraram e estas dinâmicas acabam por mudar muito a nossa trajetória. E aqui tenho de pegar naquilo que o Pedro acabou de dizer: estamos cada vez mais a seguir o nosso caminho em vez de queremos agradar a este e àquele. Nós simplesmente queremos fazer a música de que nós gostamos e na qual acreditamos e não a música que esperam que nós façamos. No passado já o fizemos e demo-nos mal com isso. Agora temos vindo a saber o som no qual acreditamos e a coisa está a correr muito melhor. Estamos mais maduros.
PT: Passaram doze anos desde que começámos. Começámos a tocar em bares com versões de Stevie Wonder e James Brown. Fizemos o primeiro disco e apresentámo-lo aqui há dez anos. Passados uns dias fomos até aos Estados Unidos tocar. Temos uma história doida para contar, mas eu nunca senti os The Black Mamba tão sólidos e tão capazes como neste momento. Isto deve-se tudo às pessoas que estão connosco e que nos ajudam a cada momento.