O calor apertava, as ruas enchiam-se e as portas traziam novas caras. Por volta das 16 horas, num combate inglório contra o calor sentido no recinto do Rock In Rio, os Ego Kill Talent só pioraram o cenário: acabados de chegar de uma tournée com os Metallica, aumentaram a temperatura com um dos concertos mais intensos, genuínos e cheios de garra. Afinal, houve espaço para o rock pesado no Rock in Rio. Momentos após o concerto, aNOTICIA.pt sentou-se com os cinco membros da banda – desta vez, num local com sombra.
É um pouco impossível não falar dos festivais de música sem abordar a questão da pandemia. E na vossa música “Now” falam precisamente em “we can overcome time”. E pergunto-vos: como foi a passagem por esta altura tão incerta para a banda?
Jonathan Corrêa: Poder rever as pessoas e contactar com elas, conseguimos subir a um palco e fazer aquilo de que mais gostamos é mesmo muito bom. Começámos esta tournée, que encerra hoje no Rock in Rio, lá no Brasil com os Metallica. Fizemos alguns festivais da Europa e cá estamos agora. Para nós é bastante importante e é impossível não mostrarmos o quão felizes estamos.
Tendo em conta que o vosso último trabalho foi lançado ainda em plena pandemia, que tipo de reação sentiram, ou como foi a experiência de lançar algo sem a dinâmica habitual de o celebrar com pessoas e em concertos?
JC: A gente teve de se aprender a adaptar com esta situação toda. O Dance Between Extremes foi lançado durante a pandemia, mas não foi tanto como estávamos à espera. Quando o começámos a fazer, não tínhamos na mente que estaríamos a viver esta crise pandémica, por isso imaginámos levá-lo às pessoas como habitualmente o fazemos – com concertos, tournées e tudo isso. Desta vez, lançar um álbum sem o calor habitual ao qual estamos habituados foi bastante complicado. Mas todos os artistas tiveram de arranjar uma forma ou outro de se adaptarem, apesar do quão difícil seja. E tivemos ótimos resultados: o álbum trouxe-nos ótimas críticas, chegou a nº 1 mesmo fora do Brasil…Estamos mesmo muito satisfeitos.
Raphael Miranda: Pois, exato. Para uma banda de rock, é frustrante fazer um álbum e não o apresentar ao vivo – e nós pensamos sempre muito na experiência ao vivo. Pensamos sempre como as músicas vão soar num show. Mas na realidade estamos agradecidos por termos sobrevivido à pandemia, pois foi difícil para todo o mudo e não só para nós. Psicologicamente, vamos levar uma grande cicatriz devido a isto.
Jean Dolabela: Enquanto banda, falámos que as pessoas neste momento estão a precisar de arte. Achamos que nos fez bem compartilhar com as pessoas algo no qual estávamos a trabalhar há tanto tempo.
Talvez este período tão irregular vos tivesse inspirado a lançar um disco acústico? Algo para se aliar à necessidade que as pessoas tiveram de ficar em casa?
JC: Com certeza. A gente estava a enlouquecer, na verdade. Foi um período muito difícil. Nós tínhamos quase 65 shows entre o Brasil, México, Europa Estados Unidos e Europa. Foi tudo adiado. Ficávamos imaginando que iríamos voltar. Vínhamos as notícias de que as coisas estavam a melhorar e que conseguiríamos voltar aos palcos. Chegámos a ter concertos marcados para 2021, mas caía tudo devido às novas vagas e ao aumento dos casos da COVID-19. Daí, começámos a estender a nossa música e a explorá-la de formas diferentes para esta altura tão diferente. Fizemos dos limões limonada.
JD: Nós já tínhamos falado em fazer algo acústico porque a música para nós é sempre um exercício em conjunto, por isso há sempre momentos em que alguém gosta da melodia de uma música, gosta da forma como está a ser composta e parte de nós gostaria de explorar esses fatores de formas diferentes. É uma oportunidade que tivemos para colocar a música despida: tirar a coisa pesada, os riffs, e deixar um foco mais na letra, na melodia. Não foi algo unicamente exclusivo à pandemia. Mas a vontade sempre foi nossa.
JC: Foi uma decisão artistas forçada, mas boa. Fez com que lidássemos com assuntos muito diferentes e que tratássemos também os medos que todos nós tínhamos. Este novo material fez com que enfrentássemos esta altura mais difícil.
Vocês saíram há pouco tempo de uma tournée com os Metallica no Brasil. Sabendo que foi uma experiência com uma banda que vos influenciou tanto, é possível estabelecer uma linha entre os Ego Kill Talent fãs de Metallica e os Ego banda de abertura?
JD: Não há linha. Eu e o Rapha conhecemo-nos num show de Metallica em 1999. Eu toco guitarra por causa dessa banda. Eu toco guitarra porque queria tocar os riffs que o James Hetfield escrevia. Foi graças a eles que temos, de alguma forma, uma banda. Portanto, tenho a oportunidade de tocar com eles, falar com eles foi fantástico. Há sempre aquelas pessoas que nós admiramos e nos dececionam; com eles foi completamente o contrário: depois de os conhecermos, ficámos cada vez mais apaixonados pela banda e por aquilo que eles nos representam. O James assistiu a todos os nossos shows.
Theo: O Lars gravou os nossos shows e enviou para o nosso manager.
Para uma banda como os Ego Kill Talent, que passaram por festivais como o Nova Rock e o lendário Rock am Ring, como foi abraçar uma plateia que não vem cá somente para o heavy metal?
JD: O público português reagiu tal e qual como estávamos à espera. A galera conectou com a gente. O Rock in Rio tem esta coisa de ser uma mixórdia de coisas, mas tem sempre o espírito do rock. Nós temos um repertório de coisas mais pesadas e sinto que fomos muito bem recebidos. Temos tocado em vários festivais e esse calor é presente em muitos públicos. Tínhamos saudades disso. Nós até chamámos esta tournée “Better Late Than Ever” como forma de finalmente levarmos esta nova música a tanta gente. E, cara, estamos mesmos contentes.