Super Bock em Stock 2021 – Dia 1: A música e a euforia nos quatro cantos de Lisboa

Em 2021 o Super Bock em Stock voltou a Lisboa para uma edição que decorre em várias salas de espetáculos, nos dias 19 e 20

Super Bock em Stock 2021
Super Bock em Stock 2021 – Dia 1: A música e a euforia nos quatro cantos de Lisboa - ©Armando Saldanha (Aldrabiscas)

Super Bock em Stock 2021 – Dia 1 

Há dois anos, o cenário seria exatamente o mesmo: as ruas da Avenida da Liberdade cheias de luzes que antecipam a época natalícia, o tempo que já pede agasalhos, os bares e os restaurantes que se recusam a fechar portas tão cedo, os jovens de cigarro na boca e de cerveja na mão. A noite de ontem na capital lisboeta foi semelhante, mas enquanto o Infarmed se reunia há poucas horas para repensar as medidas de prevenção face ao aumento de casos em Portugal, a música teve mais uma oportunidade de desconfinar. O Super Bock em Stock voltou a Lisboa em 2021 para uma edição que decorre em várias salas de espetáculos, nos dias 19 e 20. O aNOTÍCIA.pt marcou presença e relatou a noite segundo quem desceu e subiu a Avenida.

20h50 – Pelas ruas do Rossio

O desconfinamento nota-se em peso por Lisboa. Várias são as razões para se dar um passeio pela Baixa: barraquinhas montadas, restaurantes ao ar livre, entretenimento nas ruas e o desfile de luzes de Natal que dá cor aos cantos da cidade. Por momentos, há uma sensação volátil de que a realidade que outrora conhecíamos voltara; e apesar de parecer cândido falar sobre o COVID-19, a verdade é que por um instante a Rua das Portas de Santo Antão estava cheia e vibrante – e a noite ainda estava por começar.

21h00 – Nena, Cinema São Jorge

A primeira paragem para a edição de 2021 do Super Bock em Stock foi pelo mítico São Jorge. O festival começara ao final da tarde na mesma sala, mas este encontro marcado era na verdade um encontro de primeiras vezes: Nena estreou-se ao vivo rodeada por aqueles que lhe são mais próximos: o irmão, a cunhada – a quem dedicou uma música –, os amigos e ainda com a presença da mãe na memória (“a minha mãe tem sempre razão”, cantou entre risos tímidos em um dos temas). Apesar da imperícia e do nervosismo habitual, o trunfo escondido na manga de Nena é precisamente a capacidade de tornar grandes momentos em pequenos segredos partilhados por quem somente lá esteve: de cativar uma audiência com a sua proximidade e fazer com que as suas histórias se tornem uma língua comum.

Nena parece já dominar esta perícia. Em menos de uma hora, houve espaço para “Sou Só Eu”, “Santo Popular” e duas rendições de “Portas do Sol”, uma ode a Lisboa e aos amores que a cidade viu azedar. Houve ainda espaço para um dueto com João Só no tema “Deixa-me Ir”, escrito pelos dois em pouco menos de quinze minutos.

Muitos destes temas são inéditos e ainda sem casa discográfica, mas mostram já que, a rumo lento, Nena poderá torna-se na próxima banda sonora dos lusco-fuscos no Cais do Sodré, ou nos passeios de carro pela marginal. Em “Portas do Sol” canta: “Dizes que não gostas de alguém que sonha para além de Portugal” – e por agora queremo-la só para nós.  

 

Nena
Nena – ©Armando Saldanha (Aldrabiscas)

22h05 – Pela Avenida abaixo  

Nena foi um início de noite calmo e sereno, perfeito para reservar energias para o decorrer do festival. As ruas continuam preenchidas, pois era cedo em tempo lisboeta e havia ainda muito para ver. A esta hora, Paulo Novaes distribuía os ritmos cálidos do Brasil pela Casa do Alentejo; no fundo da rua, no Largo São Domingos, os portugueses Atalia Airlines traziam o hip-hop ao Palácio da Independência. O próximo destino era mesmo ali ao lado, só bastava descer novamente a Avenida e regressar à Rua das Portas de Santo Antão.

22h15 – Django Django, Coliseu dos Recreios

Ao entrar no Coliseu, várias foram as pessoas que escolheram comprar um cachorro quente ou encher o copo mais uma vez. A sala parceria tímida, mas facilmente cresceu em forma. O quarteto Django Django, cabeça-de-cartaz deste primeiro dia, ansiava regressar a Portugal há algum tempo, e os portugueses ansiavam vê-los novamente: “este é o nosso primeiro concerto internacional há dois anos. Hoje vimos a praia e não queríamos acreditar”, conta Vincent Neff, o vocalista. O mote é o novo álbum, Glowing In The Dark¸ e com ele uma excelente oportunidade para reviver – e, claro, dar dois passos de dança – o som de uma das bandas mais frenéticas do rock psicadélico.

“Spirals” foi uma abertura simpática com sintetizadores espaçosos e uma percussão pesada e desvairada. Logo de seguida, ouviu-se “Storm”, “Tic Tac Toe”, “Waking Up”, “First Light”: o salto entre temas recentes e clássicos tornou a experiência ao vivo um pouco ambivalente, pois quando efetivamente os primeiros acordes de “Default” surgiram, nem todos estavam atentos para a euforia que este tema normalmente recebe. O próprio recinto acabou limitar o arrojo e o dinamismo que a banda carrega nos seus concertos: Django Django cabem em festivais ao ar livre – e de preferência de verão –, sítios onde se sentem confortáveis e onde as características alucinantes e sensoriais das suas canções mais brilham.

Django Django
Django Django – ©Armando Saldanha (Aldrabiscas)

23h15 – Pela avenida acima

Subir e descer a Avenida da Liberdade pode parecer uma boa forma de exercício físico, mas é na verdade o itinerário para quem percorre os vários recintos do Super Bock em Stock – e serão assim as noites destes dois dias. Podia-se facilmente ficar a ouvir Django Django, mas a meio da avenida estava The Legendary Tigerman, um dos nomes pesados do cartaz e verdadeiro animal em palco.

23h20 – The Legendary Tigerman, Teatro Tivoli BBVA  

“Se o caminho até aqui estava difícil, então daqui para a frente vai ser ainda pior”. Paulo Furtado pronunciou estas palavras a uma sala meia cheia, momentos antes de entrar em pleno modo feroz. É impressionante testemunhar a forma sólida e forte, ao longo de quase duas décadas, de um verdadeiro one man show, que se mostrou cheio de energia e estamina. Na sala do Tivoli BBVA, expôs o intocável espírito punk ao controlar a música como bem queria, durante o tempo que queria. Sozinho em palco, só com o apoio de várias guitarras, um pequeno drumset e outros efeitos sonoros, viajou pelo rico reportório do rock, do punk e do blues, passando por temas como “Bad Luck Rhythm ‘N’ Blues Machine”, “Do Come Home” e ainda “The Saddest Thing To Say”, com o apoio virtual de Lisa Kekaula. Atrás dele, eram projetados excertos do filme Fade Into Nothing, que lembravam facilmente o ambiente retro e noturno de Paris, Texas: estórias das longas estradas esquecidas do deserto americano, de homens de culto, e de experiências estonteantes pelo hedonismo – “É melhor aproveitar para sair à noite, ver concertos, fazer amor”, partilhou com o público. O concerto de Paulo foi uma experiência que apelou a todos os sentidos da maneira que só uma verdadeira estrela de rock consegue executar. Quando se chegou a “Black Hole”, era impossível escapar a uma parede de som incomensurável, como se 50 músicos estivessem em palco. Diz-se que um homem prevenido vale por dois, pois Paulo vale por uma carrada deles.

The Legendary Tigerman
The Legendary Tigerman – ©Armando Saldanha (Aldrabiscas)

O Super Bock em Stock continua a percorrer as ruas de Lisboa este sábado, com destaques para Iceage, Wet Leg, Cláudia Pascoal, Monday e tantos outros nomes. Até lá, veja a fotogaleria do primeiro dia.