Guardiões da Serra da Estrela: ‘Dar o nosso tempo à Estrela’
Não há Verão que aconteça em que o tema dos incêndios rurais não faça parte do nosso léxico. Este ano, a Serra da Estrela viveu um dos maiores atentados da sua vida mais recente. Mais de 25.000 hectares do seu parque natural desapareceram, tal como o conhecíamos até meados de Agosto. As perdas, a nível da biodiversidade, foram imensas; comunidades agro-pastoris foram delapidadas de todo o seu ganha-pão; várias atividades comerciais e de raiz turística sentiram na pele um rombo aberto por um torpedo chamado fogo.
União para recuperar
Muito se escreveu (e se escreve) sobre o drama, a tragédia, o horror do incêndio, mas o tempo não tem autonomia limitada e continua a correr. Agora, é tempo de pensar no que existe do outro lado do muro e olhar para o futuro com esperança coletiva: estas duas palavras que traduzem um sentimento que move mundos. Uma árvore isolada, não faz uma floresta e, como cidadão, como habitante local que agora abre a janela e olha para a Estrela sem o seu véu de encanto, também não fico desapegado ao trabalho hercúleo que está a ser preconizado por várias associações, entidades locais e públicas, empresas, cidadãos singulares na construção de um núcleo de vontades para alimentar o futuro de energia inacabável.
Está aqui o anteprojeto de um reator onde desejamos que irradie a energia necessária para minimizar as perdas de quem tudo perdeu; de pensar coletivamente (respeitando a natureza tão própria) os ecossistemas da Serra da Estrela para o século XXI; de interiorizarmos que, nesta montanha, as atividades agro-pastoris tradicionais / sustentáveis e os próprios ecossistemas se fundem num organismo só.
Dizer não ao fatalismo
A resiliência e a entreajuda nos momentos críticos é uma propriedade associada ao ser humano. Foi assim que evoluímos desde há 5 milhões de anos e foi assim que demos (e vamos continuar a dar) novos mundos ao mundo. Não querendo ser injusto, algo que não me assiste como cidadão, não é possível ficar indiferente a uma associação em particular que, desde o primeiro momento, assumiu o lema “dizer não ao fatalismo”.
Sapadores comunitários
Que nem batedores, que nem uma equipa de sapadores nas costas do incêndio, um conjunto de pessoas comuns, voluntários, de causas acérrimas na proteção da Serra da Estrela e das suas comunidades, conseguiu algo que nunca se pensou ser possível: ao dia de hoje, foram ‘alvo’ da sua ajuda e voluntariado em alimentação e recuperação de estruturas, centenas de pastores e milhares de cabeças de gado. Tiveram nesta associação, um pequeno amparo, uma mão para continuarem a sua vida quando sentiram o chão a desabar. São eles os Guardiões da Serra da Estrela.
A ponte que faltava
Munidos de uma vontade própria difícil de contrariar, moveram serras, derrubaram barreiras, deram do seu tempo e trabalho para assegurar aquele conforto sentido e imprescindível aos pastores serranos, verdadeiros guardiões da Serra da Estrela, os modeladores das paisagens ‘estrelenses’ há milénios e responsáveis pela existência das nossas aldeias, vilas e cidades no interior e orla desta montanha. Num esforço titânico, no terreno enterrados em cinza e em pó, construíram a ponte entre quem precisava de um apoio de emergência e a comunidade civil, sendo esta fundamental, com a sua generosidade ímpar e surpreendente, para que a ponte tivesse o seu propósito e não fosse meramente um bluff.
Sustentação de uma vontade
O trabalho ainda agora começou. A barra do Loading apenas está um pouco acima dos 0%. Há desafios nas próximas décadas que até as melhores previsões têm margens de erro consideráveis.
O trabalho desta associação, em conjunto com todas outras que partilham este crer, vai continuar neste e noutros campos de intervenção. O apoio às comunidades de montanha vai continuar por tempo indeterminado, quer no apoio direto, quer na ligação e facilitação de informação para medidas de apoio estatais; na recuperação dos solos degradados e nas medidas de emergência para a sua sustentação; na conceção de propostas fundamentadas para uma nova orgânica dos ecossistemas florestais e do seu ‘interface’ com a sociedade; entre outros igualmente importantes.
Dedicação
Toda esta dedicação e perseverança têm como objetivo excelso, que a Estrela e as suas comunidades, ricas em tradições e costumes, voltem a brilhar de novo. Contudo, esta dedicação, para continuar a ser exequível, precisa de pessoas (quem sabe de si, que está a ler este texto). Comunidade ou comunitário significa isso mesmo: algo que para existir é de todos e depende de todos, não só de alguns. Graças a todos, em uníssono, a Serra da Estrela e as suas comunidades locais vão resplandecer ainda mais e melhor.
Para conhecer melhor o trabalho desta associação ou mesmo para fazer parte desta nova visão coletiva, pode consultar o site: