Penha Garcia: Tesouros de perdição…

8 Km… É esta a distância indicada numa placa da estrada nacional a caminho da aldeia de Penha Garcia. Vamos procurar o tesouro escondido nas suas costas que, tal como o ouro, este está bem escondido e invisível. É a caminhar que o vamos descobrir, conhecer e aprender.

Penha Garcia
Penha Garcia terra de Tesouros de perdição… - © Nuno Adriano

1º Tesouro: a aldeia de Penha Garcia.

Estou com um grupo familiar, gente cujas palavras de ordem é a alegria e bem-estar. Estacionamos o veículo no Largo do Chão da Igreja, junto a um tanque militar, uma paisagem não muito comum em terras da Beira Baixa, mas uma sentida homenagem aos militares naturais de Penha Garcia presentes no conflito do Ultramar. As cores das casas mais claras, com os tons tão próprios dos quartzitos, contracenando ao longe com a cor mais escura e rude, por exemplo, da vizinha Monsanto, reflecte a luz límpida do sol e do céu azul, dando mais cor e maior ímpeto para caminhar: “começamos muito bem”, dizem os meus convidados.

2º Tesouro: o vale do Ponsul.

Chegamos à Igreja Matriz, de raízes medievais e que ostenta uma colossal pia de granito do mesmo período. Contornamos a mesma e… vários segundos de silêncio reina entre nós. É o tesouro de Penha Garcia que se revela aos nossos olhos. Um vale cavado de uma imponência atípica e com uma morfologia cuja ‘beleza’ é palavra mais indicada. Neste vale, a história colide com a natureza.

3º Tesouro: o castelo.

Mas primeiro subimos ao castelo, onde as vistas valem por milhões de palavras: mais um tesouro entre muitos nesta região beirã. A vastidão torna-nos pequenos e faz-nos compreender que afinal é natureza que tudo gere.

4º Tesouro: os icnofósseis de trilobites.

Descemos por uma vereda a caminho do rio Ponsul. A cada passo, a cada curva apertada do trilho, recuamos no tempo. Com tons esverdeados pelas ricas comunidades liquénicas deste local, as escarpadas cristas quartzíticas agora em posição vertical, contam-nos uma extraordinária história da geodinâmica deste local. Encrostados nalgumas rochas, são visíveis icnofósseis, “pegadas” deixadas nos fundos lodosos pelas trilobites, organismos vivos que proliferavam no nosso planeta no período Paleozoico, quando esta região era uma zona costeira, banhada por um oceano de águas tumultuosas e alimentadas ferozmente por ventos ciclónicos. Um vale que é um verdadeiro livro sobre quase 500 milhões de anos…

5º Tesouro: as suas gentes.

Pequenas casas típicas acompanham o curso do rio e é sentado à porta de uma delas que está o nosso anfitrião. A sua alegria é contagiante, o seu gosto em explicar e mostrar o que a sua terra tem é do mais louvável e da maior riqueza. É este o espirito do interior, em que cada pessoa é um verdadeiro livro de histórias. É este mais um dos nossos patrimónios…

Da casa típica do moleiro, ao museu das trilobites, aos moinhos de água que, como um relógio suíço, trabalham com uma precisão de alta tecnologia. É vermos as nossas tradições ‘in loco’, com os nossos olhos, vivê-las como no antigamente. É assim que deve ser o turismo. Mostrar que para termos um futuro como povo, temos que valorizar, compreender e dar sentido às nossas raízes.

6º Tesouro: um spa natural.

Continuamos a nossa caminhada pelo vale e lentamente o calor toma a dianteira. Mas não nos podemos esquecer que estamos numa terra de tesouros. E outro surge: uma praia fluvial convidativa, com uma cascata como cabeça de cartaz e o melhor de tudo, quase só para nós. É um local mágico de fazer inveja ao Harry Potter. É neste cenário “cinéfilo” que vamos almoçar, descansar e refrescar-nos neste paraíso do interior. As horas aqui não passam, voam com uma rapidez lancinante. Tive que convencer os meus convidados a sair da água tépida de um spa natural e iniciarmos o regresso. É sempre um trabalho árduo da minha parte.

7º Tesouro: perdição.

Regressamos à aldeia e, do nada, o cheiro de pão quente invade as ruelas. A gula toma conta da nossa consciência. Eis que seguindo o cheiro, encontramos o forno comunitário em “plena laboração”. Um forno a lenha, tal e qual como do tempo dos meus avós. Pão tradicional pronto a ser retirado do forno, pão este amassado à mão com todo o carinho e sabedoria das gentes de Penha Garcia. De repente, surge a manteiga na mesa e cedemos todos à perdição. O verdadeiro luxo…

8º Tesouro: uma luz que não desaparece.

“Já terminou?”. Esta é parte mais dura de ouvir no meu trabalho. Dizer que tudo tem um fim e que é necessário regressar. Em compensação sinto que o meu trabalho foi cumprido, pois consegui transmitir a quem nos visita, que esta é uma região onde a ‘luz’ do sol parece que nunca se põe. É o 8.º tesouro dos milhares que aqui existem…

 

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